
Foto por: Jansy Mello
Autora:
Jansy B S Mello
Discurso da Verdade Una
E entender que semelhança não é identidade significa se proteger contra as ambições da Coisa Única. Dá material pra muita discussão boa, essa tese do Eco.
Mas estou divagando. O que me chama a atenção no presente momento, considerando perfis com inclinação new age / good vibes / mindfullness é o seguinte discurso que todo dia me mandam, quase sempre acompanhado por uma foto bem cafona que tenta retratar a natureza, mas com uma idiossincrasia: em cores artificiais de photoshop.
As mensagens dizem: em um momento como este, não leia as notícias, não envenene sua aura luminosa com informações políticas, leia apenas coisas boas, não veja os jornais. O que é uma forma namastê de dizer “ignore a política”. Mas, que engraçado, é um pedido pra ignorar AGORA que Bolsonaro é vidraça.
Porque antes, essas mesmas pessoas que agora me orientam a cantar mantras e a pensar nas libélulas dos bosques e nas fadas de Yorkshire, antes elas inundavam minha vida com “Fora Dilma”, “veja esta notícia”, “veja aquela”, “que escândalo”, “a esquerda vai transformar o Brasil em uma Venezuela”. E justo agora que o Brasil está virando o koo do mundo, elas querem que eu feche os olhinhos e vá cantar mantras.
É preciso um grau todo especial de tara fascista pra tentar seduzir os outros à ignorância política neste momento. Sejam menos sonsos e assumam seus gostos.
Namastreta.
Debate:
Jansy: Fiquei estarrecida quando meu comentário numa postagem foi deletado. A autora, sempre simpática e acolhedora, se esparramava sobre solidariedade e união criando um vasto abraço de “nós”. Questionei o simpático sonho: “e como garantiremos as diferenças?” e Zapt. A resposta veio com o desaparecimento de tudo. Posteriormente aquele tudo foi repostado. Mas do zero. Não havia o comentário das diferenças. O mundo da caridade pode ser perigoso…
Conceição: Gente boazinha demais me dá arrepio
Jansy: Conceição, perdi o acesso a um desenho animado francês dos anos sessenta sobre isso. Muito bom. Les Maitres du Temps. Quando faço busca aparecem outros com o mesmo título. Ironia. Ficou tudo igual… No rótulo apenas
Vera: Jansy, o mundo da caridade pode ser hipócrita …..
Jansy: Vera,com certeza. Ou autoritário. Sabem o que o mundo precisa receber de modo categórico
Angela: Usam armas sem nenhuma seriedade, hipócritas
Gustavo: Acho que o fascismo, fascismo mesmo, não tá aí não. Não na tentativa de equalização, na cafonice good vibes etc. O fascismo reconhece sim a diferença (alucinatoriamente muitas vezes) e a repudia, com violência se for preciso. O fascismo vai além da hipocrisia e das boas maneiras forçadas. Em poucos dias um marmanjo desocupado (ou muito bem pago) ameaçou uma enfermeira que protestava em Brasília, e uma moçoila acertou uma bandeira (do Brasil obviamente) na cabeça de uma jornalista. Assim como um jesuíta não se acha igual ao índio. Ele sonha com a capitulação do outro, da opinião alheia, da cultura alheia. Diferente do pé-no-saco holístico, na minha opinião… Mas reconheço esse conservadorismo hipócrita e assimétrico, e esse bolsonarismo envergonhado e tenho pouquíssima paciência. Mas sou pela escolha de um inimigo de cada vez, não por convicção, mas por estratégia.
Jansy: Gustavo, bem posta a questão do reconhecimento da diferença. No entanto, tanto no fascismo puro quanto na cooptação pela bondade essa diferença é esmagada. Não tem como escolher um inimigo de cada vez. Esses grupos se apresentam no mesmo momento. O fascismo histórico é barulhento e sádico. O outro exemplo é manso e auto iludido.
Gustavo: Jansy, tenho o temor de alargarmos demais os conceitos, mesclarmo-los, criarmos híbridos até o ponto de desnaturá-los e não significarem mais nada, pois significam demais. Aí todos viram inimigos… Particularmente prefiro guardar o conceito para os sádicos, até para não atenuá-los. Mas percebo o mal que todos, barulhentos ou mansos, fascistas ou apenas hipócritas, causam.
Jansy: Gustavo, concordo com o risco de exagero na atribuição de sentidos, até implodirmos os significados. No texto sobre namastretas eu gostei do empréstimo provisório para causar espanto e provocar argumentos… Não como algo definitório.